por Margarida Ornelas*
* Presidente do Instituto Português de Oncologia de Coimbra, Dr. Francisco Gentil Martins
APandemia de COVID-19 colocou os Sistemas de Saúde sob enorme pressão. No entanto, neste contexto de Pandemia, também se criaram novas oportunidades, em todo o Mundo, sendo uma delas a da dinamização da Telemedicina. A Telemedicina assumiu-se, com efeito, como uma excelente ferramenta e um forte aliado, quer dos profissionais de saúde, quer dos doentes.
Em Portugal, a comunicação social noticiou o fenómeno da Telemedicina a atingir valores recorde, os quais derivaram de uma mais crescente motivação para a sua aplicação. A Telessaúde entrou no léxico dos portugueses: nunca como nestes tempos se falou tanto de teleconsultas, teletriagens, telemonitorizações.
A realidade da Telemedicina, porém, não é nova, tem aliás várias décadas de existência, assinalando-se na Região Centro o papel de alguns percursores, como seria o caso do visionário Dr. Eduardo Castela, que no ano de 1995, procurando responder à impossibilidade de existir, em cada Hospital Distrital, um especialista de Cardiologia Pediátrica e de Cardiologia Fetal, contribuiu com a Telemedicina para melhorar o apoio aos cuidados na Região Centro, tornando já, à época, real o presente desígnio das Nações Unidas: “Não deixar ninguém para trás”.
Em 2006, com a publicação da Portaria n.º 567/2006, de 12 de junho que aprova as tabelas de preços a praticar pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), bem como o respetivo Regulamento, fazia-se já menção à Teleconsulta como a “Utilização de telemedicina na consulta externa”. Atualmente a Teleconsulta é definida como uma consulta na qual o profissional de saúde, à distância e com recurso às tecnologias de informação e comunicação, avalia a situação clínica do utente e procede ao planeamento da prestação de cuidados de saúde, distinguindo-se os conceitos de “Teleconsulta em tempo real” e “Teleconsulta em tempo diferido”.
É certo que a Telemedicina evoluiu ao longo dos tempos e se assumiu como uma estratégia a ter em conta. A este propósito, refira-se o documento na área da Telessaúde para o Sistema Nacional de Saúde, preparado pelos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), através do Centro Nacional de Telessaúde: “Plano Estratégico Nacional para a Telessaúde 2019-2022”. No entanto, nos últimos meses, a atual crise de saúde pública fortaleceu de modo inequívoco a convicção de que a Medicina à distância pode e deve ser uma opção para a promoção da saúde e prestação de cuidados.
No entanto, nos últimos meses, a atual crise de saúde pública fortaleceu de modo inequívoco a convicção de que a Medicina à distância pode e deve ser uma opção para a promoção da saúde e prestação de cuidados.
O sistema mudou rapidamente e os profissionais e os doentes adaptaram-se a uma realidade, que não sendo nova, revolucionou a nossa forma de estar. O desenvolvimento de uma plataforma pela SPMS – RSE Live – veio permitir a realização de Teleconsultas em tempo real com os utentes e entre profissionais de saúde, podendo as consultas ser realizadas remotamente, através das novas tecnologias de informação e comunicação, caso o médico entenda e o utente aceite. Várias unidades hospitalares do SNS intensificaram, nos últimos meses, a utilização da Telessaúde, de modo a dar resposta à prestação de cuidados, sendo que um dos principais motes para a sua utilização foi o de garantir a qualidade nas consultas de acompanhamento durante a pandemia.
As vantagens da Telemedicina são por demais evidentes, destacando-se: a equidade no acesso a cuidados de saúde, a proximidade, a otimização dos recursos. Sendo uma ferramenta que vai ao encontro das necessidades dos doentes, traduzindo-se num instrumento facilitador da integração de cuidados, poderá, ainda, potenciar a melhoria dos resultados em saúde. Já em 2019, os resultados do “Barómetro da Adoção da Telessaúde e de Inteligência Artificial”, iniciativa conduzida pela Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares e a Glintt-Global Intelligent Technologies, S.A., numa parceria científica com a Escola Nacional de Saúde Pública e com o apoio institucional da SPMS, vieram a revelar existir largo consenso quanto à partilha de dados clínicos por Telemedicina como promotora de uma adequada orientação e adesão à terapêutica dos doentes.
As vantagens colocadas por estas tecnologias e as perspetivas futuras configuram a possibilidade de existência de Teleconsultas entre um médico e um doente, mas igualmente a Teleconsultadoria entre profissionais e a Teleformação, perspetivando-se, deste modo, um manancial de oportunidades provocado pelas novas tecnologias.
A Telemedicina coloca, no entanto, vários desafios às instituições, não só em termos de organização, como em termos de reforço do investimento.
À semelhança de outras entidades do SNS, também o Instituto Português de Oncologia de Coimbra (IPO de Coimbra) considerou a importância vital da Telemedicina, inscrevendo-a como uma das áreas de desenvolvimento estratégico no seu Plano de Atividades e Orçamento para o triénio 2019-2021. O enfoque atribuído à área da Teledermatologia foi um dos principais destaques.
A Teledermatologia poderá ter um papel importante na referenciação dos doentes com doenças dermatológicas para centros especializados, ao permitir uma triagem mais eficaz, bem como a realização de Teleconsultas. Em 19 de julho de 2019, foi celebrado um Protocolo de Colaboração entre o IPO de Coimbra e a SPMS. A SPMS e a Associação Fraunhofer Portugal estão a colaborar no projeto DERM.AI, que faz uso da Inteligência Artificial para potencializar o Rastreio Teledermatológico, encontrando-se o IPO de Coimbra a participar nestes projetos de investigação que visam facilitar a referenciação pelos médicos de Medicina Geral e Familiar. O projeto DERM.AI, desenvolvido a nível Nacional, tem dois principais objetivos: avaliar uma aplicação móvel que permite uma aquisição fácil de lesões de pele com qualidade e o desenvolvimento de uma plataforma de Inteligência Artificial para priorização do risco das lesões. Esta plataforma usa, não só as imagens registadas, mas também informação clínica e baseia-se em dados retrospetivos de maneira a constituir uma ferramenta de apoio à decisão do triador. Em estreita relação com este projeto, decorre atualmente no IPO de Coimbra o projeto MDevNet que permitirá ter um feedback sobre a utilização da aplicação móvel pelos dermatologistas e, ao mesmo tempo, adquirir um conjunto de imagens e respetivas anotações que permitirão robustecer a tecnologia.
À semelhança de outras entidades do SNS, também o Instituto Português de Oncologia de Coimbra (IPO de Coimbra) considerou a importância vital da Telemedicina, inscrevendo-a como uma das áreas de desenvolvimento estratégico no seu Plano de Atividades e Orçamento para o triénio 2019-2021. O enfoque atribuído à área da Teledermatologia foi um dos principais destaques.
Em conclusão, numa nova era com cidadãos mais exigentes e informados e cada vez com maior recetividade ao uso de novas tecnologias de informação, impõe-se apostar na Telemedicina.
Ainda que tenha que haver lugar, a maior normalização e regulamentação sobre as matérias da Telemedicina, há um consenso já generalizado sobre os benefícios para os cidadãos, sendo a sua participação essencial em todo o processo de adesão e desenvolvimento. A Telemedicina será mesmo um garante para os tornar mais inclusivos. Por seu turno, os profissionais de saúde, como sempre, desde a Fundação do SNS, demonstraram uma enorme capacidade de resiliência e liderança perante as dificuldades que a Pandemia colocou e ainda nos coloca, pelo que serão, igualmente, capazes de responder ao desafio da Telemedicina, com arrojo e determinação.
Sejamos, pois, capazes de construir o futuro desta Telemedicina, permitindo, no presente, que esse futuro possa acontecer. Parafraseando Saint-Exupéry: “Préparer l’avenir ce n’est que fonder le présent. […] Il n’est jamais que du présent à mettre en ordre. À quoi bon discuter cet héritage. L’avenir, tu n’as point à le prévoir mais à le permettre” (Citadelle, cap.LVI).