por Micaela Seemann Monteiro*
* Médica, especialista em Medicina Interna
Directora do Centro Nacional de Telesssaúde – CNTS entre Julho de 2017 e Janeiro de 2020

Na luta contra a COVID 19, tem sido um serviço de telessaúde, uma das armas fundamentais em Portugal. O SNS24 tem sido o ponto central para a identificação de casos suspeitos e seu correto encaminhamento. Tudo à distância, sem risco de contágio para cidadãos e profissionais. Teve, em poucos dias, e com curtíssimo pré-aviso, de adaptar a sua capacidade de resposta de uma média de 3500 contactos por dia para mais de 40000.

“Só uma crise – real ou sentida – produz uma mudança real. Quando essa crise ocorre, as ações que são tomadas dependem das ideias que estão à volta. Essa, creio, é a nossa função básica: desenvolver alternativas às políticas existentes, mantê-las vivas e disponíveis até que o politicamente impossível se torne o politicamente inevitável”.

Estas afirmações do economista Milton Friedman, galardoado com o Prémio Nobel em1976, parecem aplicar-se de forma perfeita aos dias que correm, quando observamos a ascensão da telessaúde enquanto uma prioridade dos sistemas de saúde em todo o mundo.

As oportunidades em recorrer às tecnologias de informação e comunicação (TIC) são evidentes: gerar ganhos em saúde e aumentar eficiência dos seus serviços. A telessaúde e a saúde digital facilitam e aumentam o acesso a cuidados de saúde; ajudam a integração de cuidados através da criação de redes e sinergias e da partilha e melhor gestão da informação. Contudo, poder tirar partido destas oportunidades tem um preço: ousar pensar diferente e mudar.

Felizmente, em Portugal, tem havido pioneiros, que não hesitaram, pagaram o preço e – como Friedman diz – desenvolveram alternativas às práticas existentes e mantiveram-nas vivas e disponíveis. Quando o cardiologista pediátrico Eduardo Castela há mais de 20 anos implementou no seu serviço de cardiologia pediátrica em Coimbra um dos primeiros serviços de telessaúde no país, deu, de forma ainda hoje inovadora, acesso a cuidados especializados a crianças de vastas regiões dentro e além-fronteiras que de outra maneira dificilmente a teriam. Transformou o seu serviço, criando novas formas de trabalho para a sua equipa, assentes nas TIC. Criou sinergias duradouras com inúmeros serviços de pediatria com evidentes benefícios para os doentes – e ao mesmo tempo ganhos de eficiência que revertem ainda hoje para o SNS.

A Pandemia COVID19 obrigou-nos a mudar. Não deixou intocado qualquer sector das nossas sociedades. Agora é importante que todos aprendamos com esta nova forma de viver e de nos relacionarmos. Temos de saber reconhecer quais as mudanças que produzem ganhos que devam prevalecer em tempos pós pandémicos, investir e torná-las em verdadeiras transformações do status quo. Não há dúvidas: a telessaúde e a saúde digital fazem obrigatoriamente parte deste grupo.

Também na luta contra a COVID 19, tem sido um serviço de telessaúde, uma das armas fundamentais em Portugal. O SNS24, com as suas origens nos anos 90 do século passado, tem sido o ponto central para a identificação de casos suspeitos e seu correto encaminhamento. Tudo à distância de uma chamada telefónica e sem risco de contágio para cidadãos e profissionais. Teve, em poucos dias, e com curtíssimo pré-aviso, de adaptar a sua capacidade de resposta de uma média de 3500 contactos por dia para mais de 40000. Se Portugal conseguir sair desta crise sanitária sem o colapso dos seus serviços de saúde e menor tragédia humana que os seus países vizinhos – também ao SNS 24 e seus profissionais se deve.

Quando hoje, em plena pandemia, foi possível no SNS iniciar vídeo-consultas entre médicos e os seus doentes, foi porque há alguns anos atrás houve pioneiros nos Serviços Partilhados do Ministério de Saúde e seu Centro Nacional de Telessaúde que pensaram nesse canal e começaram a criar as ferramentas necessárias. Estas não se resumem às de uma simples videochamada como agora existem tantas. As vídeo-consultas estão integradas num processo clínico do cidadão – igualmente eletrónico e acessíveis ao cidadão através do seu portal digital. No final da consulta o doente pode receber a sua receita – 100% desmaterializada – por SMS ou email. Estas teleconsultas permitem, por exemplo, acompanhar os doentes crónicos cuja vida nesta pandemia está particularmente em risco e prevenir mortes por descompensação ou mesmo por infeção pelo SARS-CoV-2 contraídas nas salas de espera de hospitais ou centros de saúde.

É bom lembrar, que tudo isto tem sido construído num período de uma das maiores crises económicas e com grandes constrangimentos financeiros que impactaram o SNS. Embora houvesse, em muitos quadrantes, quem compreendesse e apoiasse, para muitos outos não passava de um devaneio a opção de investir naquilo que hoje são ferramentas importantes para o acesso a cuidados de saúde, que protegem doentes e profissionais, que salvam vidas.

A Pandemia COVID19 obrigou-nos a mudar. Não deixou intocado qualquer sector das nossas sociedades. Agora é importante que todos aprendamos com esta nova forma de viver e de nos relacionarmos. Temos de saber reconhecer quais as mudanças que produzem ganhos que devam prevalecer em tempos pós pandémicos, investir e torna-las em verdadeiras transformações do status quo. Não há dúvidas: a telessaúde e a saúde digital fazem obrigatoriamente parte deste grupo. Agarrar esta oportunidade fará a nossa sociedade sair deste período de sofrimento mais resiliente, mais justa, mais ecológica, mais humana – melhor!