por Vanda Azevedo*
* Médica Cardiologista.
Directora do Serviço Nacional de Telemedicina de Cabo Verde.

Cabo Verde, como arquipélago, com 9 ilhas e pouco mais de 550 mil habitantes, com 8 médicos/10 000 habitantes e 17 enfermeiros/10 000 habitantes, apresenta disparidades no acesso a cuidados de saúde importantes.

Consequentemente, existe a necessidade de transferência de doentes para os dois hospitais centrais do país (Praia e Mindelo), para cuidados médicos especializados. Segundo Correia et al. (2003), centenas de doentes são evacuados anualmente, com custos sociais e económicos importantes.

Para responder e minimizar os efeitos dessas desigualdades, optou-se pelas evacuações médicas internas e a deslocação de especialistas às ilhas.

Os sistemas de saúde têm considerado a telemedicina como um dos instrumentos para a resolução de problemas de acesso a cuidados de saúde (Preston, Brown e Hartley, 1992), (Galván et al., 2008). Para Álvares (2004), a utilização dessa tecnologia além de permitir o uso mais efetivo de recursos, aproxima os cuidados de saúde ao cidadão e promove a revisão e modernização dos processos e métodos de trabalho e, portanto, a mudança organizacional nas organizações de saúde.

Deste modo, a telemedicina, foi vista como mais uma oportunidade para reduzir também estas iniquidades em saúde.

Após várias tentativas desde 1998, uma experiência de êxito iniciou-se em 2009, no âmbito da Cardiologia Pediátrica, com o Hospital Pediátrico de Coimbra, Serviço dirigido pelo Dr. Eduardo Castela. Os dois hospitais centrais conectados ao Serviço de Cardiologia Pediátrica, realizavam consultas com execução de ecocardiogramas em real-time.

Em 2012, implementou-se um Projeto de Telemedicina, financiado pela cooperação Eslovénia, em associação com a International Virtual e-Hospital ( IVeH), unindo os dois Hospitais Centrais aos Centros de Saúde e aos Hospitais Regionais. Um projeto voltado para dentro, de nível nacional, permitindo nas suas três fases, a instalação de equipamentos de videoconferência e carros de teleconsulta, permitindo assim a ligação em rede, com 14 centros em todas as ilhas.

Atualmente, existe um Serviço Nacional de Telemedicina e e-Saúde para coordenar todas as atividades de telemedicina e e-Saúde.

Este serviço permitiu realizar de 2013-2018, dois mil quatrocentos e quarenta e duas (2,442) teleconsultas, As especialidades mais solicitadas foram: Neurologia com dois especialistas (n=720), Cardiologia (n=313), Ortopedia (n=190), Cirurgia (n=143), Endocrinologia com três especialistas (n= 141), Otorrinolaringologia (n=139), Urologia (n=139), e Dermatologia com uma especialista (n= 126).

Com esta rede de serviços, foi possível realizar:

  • Mestrados na área da saúde
  • Complemento de licenciatura em Enfermagem
  • Formação contínua dos médicos da periferia
  • Discussão de casos clínicos com o exterior, nomeadamente Portugal, Brasil, EUA, Canárias.

O nosso Serviço Nacional de Telemedicina corresponde a um dos projetos mais consolidados na nossa região e nos países de expressão portuguesa.

Nesta era de COVID 19, utilizámos esta rede para a organização da resposta à epidemia, formação e treinamento de todos os técnicos, atempadamente.

Preparando-nos para a pós pandemia, a nossa já boa experiência com as Teleconsultas, sempre entre o especialista e o utente e seu médico assistente, terá de evoluir para ser realizada entre o utente e o especialista. Para isso precisamos ainda de ultrapassar uma grande lacuna que é a integração da nossa rede de Telemedicina no Sistema de Informação Sanitária.

Por acreditarmos desde sempre na e-Saúde, vemos com bons olhos a utilização desta ferramenta por vários países, que tardaram a ver a sua utilidade nos seus serviços de saúde. Com isso achamos que a e-Saúde terá um futuro brilhante.